quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Aristóteles e as Mutações (i)

Escrito por Mário Ferreira dos Santos








Texto de Aristóteles

I-13

I. Mas não devemos colocar como pontos ou linhas a matéria de onde vem o corpo, pelas mesmas razões.

II. e III. E também que os pontos e as linhas são limites, que é a matéria, a qual nunca pode existir independentemente da qualidade nem independentemente da forma. (...)


Reexposição comentada


I. Já demonstrou Aristóteles que nem os pontos nem as linhas podem ser consideradas como sujeito da magnitude, nem podem existir separadamente de per si.

II. Provado por Aristóteles, que não pode ser sujeito de aumento, o que não tem a quantidade em acto ou em potência, o ponto e a linha não poderiam ser elementos consistentes dos corpos; embora o sejam da matemática, não o são da matéria enquanto tal. Falta à linha e ao ponto as dimensões que possuem os corpos materiais. Se a linha tem superfície não tem profundidade nem latitude. O ponto, por sua vez, carece de toda a magnitude. Expõe Aristóteles que os pontos e as linhas são os limites da matéria, coisas incorpóreas em acto, e não podem engendrar um corpo que tenha uma grandeza. Também a matéria não pode existir sem a sua configuração e as suas qualidades, como bem salientam os comentaristas ao analisar este tópico. Acusava Tomás de Aquino os platónicos de considerar os entes matemáticos como substâncias dos corpos naturais.

Fundamentavam eles o seu pensamento no facto de serem o ponto e a linha termos das dimensões, como a forma é termo da matéria, e afirmavam que aquilo que, pelo qual é terminado, seria a matéria dos corpos, e sendo os pontos e linhas os últimos termos, seriam consequentemente o fundamento da matéria.

III. Na Metafísica demonstrou Aristóteles que uma coisa nasce absolutamente de uma outra, e que sua causa eficiente é, ora uma coisa em acto, da mesma espécie ou do mesmo género, ora uma enteléquia. Todo o devir implica um ser em acto de onde ele se origina e ele pode ser, como o esquematiza Tricot:

a) uma coisa é em acto, quer dizer uma forma na matéria, idêntica com a coisa produzida, quer específica, quer genericamente.

b) Para a poíesis propriamente dita (realização, criação de uma obra), resultado da tekhnê (arte) uma forma, que está no espírito do artista no estado de enteléquia.

Júpiter e seus satélites


(...) Impõe-se distinguir duas classes de mutações. Há em cada mutação a transição de um termo inicial para um termo final (terminus a quo e terminus ad quem). Serão esses dois termos, para que haja mutação, diferentes entre si, pois, do contrário, não haveria mutação. Algo entre eles deve-se opor. Mas essa oposição pode ser vária. Se a oposição é contraditória, e neste caso há afirmação e negação, isto é, mutação de um "ser" para um "não-ser", não se pode dar nenhum intermediário, como já nos mostrou Aristóteles no "Organon", pois não há entre opostos contraditórios possibilidade de um meio termo. Entre ser e não-ser não lugar para intermediários. Num movimento contínuo, duas esferas que ao se aproximarem se tocam, a passagem entre o "não-tocar" e o "tocar" é instantânea, como é instantânea a passagem de um corpo do estado de quietude para o de movimento.

O outro tipo de mutação é aquela em que o sujeito da mutação passa através de fases intermédias entre o terminus a quo e o terminus ad quem. No movimento tópico, local, vemos tal exemplo, pois há uma distância que o móvel percorrerá. Nas mutações intensistas, por exemplo, aquecimento-resfriamento, dá-se o mesmo. A teoria dos minima de Aristóteles pode ser aplicada também às intensidades como já o faziam os escolásticos, como o expõe Suarez nas "Disputationes Metaphysicas"... (in Mário Ferreira dos Santos, Aristóteles e as Mutações, Livraria e Editora Logos, S. Paulo, 1955, pp. 18-19; 97-98).



Júpiter


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